Óscar Afonso, OBEGEF

A “contração económica” que o país sofreu determinou o agravamento da situação social.

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Portugal, após a entrada na moeda única, passou a registar um processo de divergência significativa em termos reais com a média europeia. A descida das taxas de juro, fruto mais evidente da convergência nominal, induziu os governos a um excessivo endividamento e a um incentivo ao endividamento dos demais agentes económicos. Na sequência desse endividamento, a poupança da nação reduziu-se e, conjugada com a perda de competitividade (fruto da perda do instrumento taxa de câmbio, do alargamento da Europa para leste e da maior penetração no mercado europeu de produtos oriundos de países como a China), determinou uma deterioração das contas externas, para além do agravamento das contas públicas. O resultado foi um conjunto de importantes desequilíbrios macroeconómicos insustentáveis no longo prazo que, num primeiro momento, incentivaram os ataques especulativos à dívida pública portuguesa e que, numa segunda fase, acabaram por obrigar à implementação de um programa de ajustamento orçamental restritivo com custos sociais significativos.

A “contração económica” que o país sofreu determinou o agravamento da situação social, em particular em áreas como o emprego/desemprego, o rendimento das famílias e a pobreza (especialmente em grupos como as crianças e os idosos). Acresce que a “contração económica” se desenvolveu num contexto de evolução demográfica muito peculiar. Efectivamente, sobre pressão de um índice de longevidade crescente, tem-se assistido ao aumento do índice de envelhecimento da população e do índice de dependência total. A relação de forças induzida por esta evolução será determinantes para o nível de pressão que o sistema de proteção social sofrerá em termos futuros.

Pela mesma ordem de ideias, no âmbito da população em idade ativa, o aumento do emprego contribui para reduzir a pressão, enquanto o aumento do desemprego contribui para o seu agravamento. Ora, por força do atual contexto, tem-se observado uma redução do nível do emprego, à qual acrescem transformações no âmbito da própria população empregada, quer respeitantes ao vínculo contratual, quer ao tempo de trabalho. Na verdade, para além da evolução negativa ao nível da população empregada, importa ainda destacar fatores respeitantes à segurança e à proteção no emprego, que se afiguram relevantes para equacionar a probabilidade de este se constituir como principal via para assegurar a integração profissional dos indivíduos. A este nível saliente-se a precariedade traduzida pelo decréscimo do número de contratos permanentes ou “sem termo”, pelo aumento da flexibilidade da legislação de proteção do emprego, pelo aumento das situações de trabalho a tempo parcial e pelo aumento no número de trabalhadores marginalmente ativos no mercado de trabalho.

Refira-se ainda que o aumento do número de pessoas em situação de desemprego teve impacto em termos de prestações sociais, afetando a execução orçamental da própria Segurança Social. Conjugando a cobertura efetiva que o subsídio de desemprego permite com, por um lado, a tendência simultânea de redução de beneficiários de Rendimento Social de Inserção (em consequência do agravamento das condições de elegibilidade para acesso aos benefícios) e, por outro lado, a precariedade ao nível do emprego é de prever uma pressão para a obtenção de rendimentos no âmbito de actividades na economia informal. Ou seja, tendo presente o impacto geral da crise ao nível do emprego/desemprego, das prestações sociais e, em geral, no risco de pobreza e exclusão social, é possivel perspetivar o efeito expectável ao nível da economia informal, como componente da economia Paralela. Assim, por um lado, a economia informal terá crescido, ameaçando o sistema de proteção social e, eventualmente, despoletando consequências gravosas nos grupos mais vulneráveis. Por outro lado, muitas das atividades de economia informal não deixarão de reflectir a reação dos indivíduos em situação de pobreza e de exclusão social.

Algumas, recentes, atividades de economia informal apresentam-se assim como uma resposta direta e bidirecional a uma necessidade daqueles que, fruto da crise, vivem em situação de pobreza e de exclusão social. Para que não seja tudo mau, espera-se que algumas atividades informais recentes se constituam como ponto de partida para uma eventual transição para o emprego formal.