Óscar Afonso, OBEGEF

menos investimento significa também menor crescimento económico e, consequentemente, menos impostos cobrados

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Após a adesão à Comunidade Económica Europeia (CEE), Portugal experimentou vários anos de crescimento significativo. Contudo, essencialmente por culpa própria, a adaptação à moeda única não foi nada positiva e, desde 1999, a economia portuguesa divergiu em termos reais dos seus parceiros da União Europeia (UE), em geral, e da zona euro, em particular.

Por culpa própria, porque, fruto do fascínio dos políticos por fazer qualquer coisa, mesmo inútil e quase puro desperdício de recursos, na sequência da descida das taxas de juro aumentaram o endividamento. Para entender o desperdício, recorde-se que um empréstimo de 100 euros a uma taxa de juro de 15% implica o pagamento de um montante de juros anuais de 15 euros, e que um empréstimo de 750 euros a uma taxa de juro de 2% implica o pagamento do mesmo montante de juros, 15 euros. Assim, em matéria de política orçamental, os governos usaram a margem de manobra induzida pela forte quebra das taxas de juro, após 1995, para expandir a despesa pública (não produtiva) em períodos de expansão, de modo que, quando surgiu a recessão, o endividamento era tal que não havia margem para uma política contra-cíclica.

Sendo necessário pagar as dívidas, os agentes antecipam que no futuro a carga fiscal aumentará de modo a gerar a receita necessária. Face a isso, obviamente que, na análise da viabilidade de projectos de investimento, potenciais investidores consideram os custos associados à fiscalidade esperada e, portanto, esperando um aumento da carga fiscal há, naturalmente, projectos de investimento que acabam na gaveta. E, claro, menos investimento significa também menor crescimento económico e, consequentemente, menos impostos cobrados, gerando-se, pois, um verdadeiro circulo vicioso.

Por sua vez, em termos de política de rendimentos, entre 1999 e 2006, verificou-se que a taxa de crescimento média anual da produtividade (1%) foi semelhante à dos parceiros da zona euro (0,8%), quando, via investimento (e se tivesse havido melhor aproveitamento de fundos estruturais) havia “espaço” para maior catching-up, o que também não deixa de reflectir as decisões erradas quanto ao investimento efectuado com os montantes anormais de endividamento. Ao mesmo tempo, a taxa de crescimento média anual dos salários (3,8%) foi superior à dos parceiros da zona euro (2,3%). O resultado foi, pois, o de uma implícita apreciação real e, por conseguinte, o de perda de competitividade dos produtos nacionais.

Para além do aumento do endividamento e da perda de competitividade, por culpa própria, repito, as dificuldades de adaptação ao novo contexto trazido pela UE, que impôs uma moeda forte, reflectiu-se também nas dificuldades criadas pelo alargamento da UE (2004-2007), em particular decorrentes da adesão dos países do antes chamado “Bloco de Leste” e pelas dificuldades criadas em termos de competitividade pela forte penetração nos mercados europeus dos países “low income” (em particular, a China), após a conclusão do Uruguay Round (1994) e a adesão da China à Organização Mundial do Comércio.

Três outros factores devem ser apontados para perceber a situação vigente antes do início do plano de ajustamento: (i) o elevado nível de endividamento de todos os agentes económicos, com significativa quebra da taxa de poupança, em particular das famílias; (ii) o aumento do peso da economia não-registada, bem superior à média da UE, com impacto na receita fiscal e, portanto, na eficiência económica, na equidade, na estabilização macroeconómica e no crescimento económico; (iii) a crise financeira internacional (após 2007) que agravou a situação descrita, ao verificar-se uma escassez de crédito e uma subida do seu preço.

Num contexto de economia globalizada, mercados interligados, inadaptação ao Euro e, sobretudo, de erros próprios, a necessidade de ajustamento foi assim determinada pela existência de um PIB oficial desalinhado do consumo privado e público (não produtivo), e pela perda de competitividade internacional.

O que há agora a fazer é diminuir o endividamento na medida do possível, equilibrar os elementos macroeconómicos, fazer reformas estruturais que conduzam ao aumento da poupança, à melhoria da produtividade (via aposta na tecnologia e nas qualificações humanas), estabelecer um novo ambiente de decisões mais previsíveis, combater a corrupção e, melhorar assim, o ambiente de negócios para que os empresários voltem a investir.