António João Maia, Diário Económico
As práticas de corrupção traduzem violações do quadro de valores em que dizemos acreditar e, nessa medida, contribuem para a promoção da desconfiança
A corrupção tem sido, sobretudo nos últimos anos, um dos temas centrais da agenda pública dos Portugueses. A propósito de todo o tipo de suspeições e quase sempre a par de investigações judiciais que envolvem destacadas figuras da vida política e do mundo dos negócios, a questão tem proporcionado inúmeras manchetes na imprensa e muitas aberturas de telejornais – com os correspondentes, em si mesmo perversos, efeitos de julgamento e condenação na praça pública.
Organizações internacionais como a Transparência Internacional, a ONU, o Banco Mundial, a OCDE ou o Conselho da Europa, têm reconhecido que a corrupção é um problema transversal a todos os modos de organização política e económica. Mas se é verdade que não existe sociedade que possa dizer-se isenta de corrupção, não é menos verdade que determinados contextos sociais e culturais, sobretudo quando associados a menores índices de desenvolvimento económico e elevados índices de pobreza, parecem particularmente propícios e expostos ao desenvolvimento e proliferação do problema.
Na prática todos os países criminalizam as acções que consubstanciam a noção de corrupção, que em regra surge associada a uma gestão inadequada dos interesses e do património público, considerando que estas práticas desvirtuam a realização adequada dos fins do Estado e dos instrumentos de governação, quer do Governo, quer da Administração Pública. Os atos de corrupção subjugam o interesse geral – cuja concretização importa assegurar e defender – a interesses particulares ou corporativos daqueles que estão envolvidos nos diversos procedimentos de gestão a todos os níveis da governação pública.
Porém, mais do que a letra da lei definidora das acções que correspondem a esse conjunto de crimes (em Portugal identificamos crimes como a corrupção, o peculato, o tráfico de influências, a participação económica em negócio, o abuso de poder, a violação de segredo por funcionário, de entre outros), a noção de corrupção exprime uma relação de desconformidade entre as práticas concretas dos sujeitos e os valores morais que socialmente invocam e defendem.
As práticas de corrupção traduzem violações do quadro de valores em que dizemos acreditar e, nessa medida, contribuem para a promoção da desconfiança nas relações entre as pessoas e para o descrédito das instituições.
No essencial a corrupção deriva de situações concretas de conflito entre interesses pessoais ou corporativos e o superior interesse coletivo da sociedade. Ainda que legítimos em si mesmos, quando em confrontação direta, os interesses particulares devem por princípio ceder ao interesse geral.
A subversão deste princípio, que decorre das práticas de corrupção, revela acima de tudo atitudes de egoísmo dos sujeitos face aos seus concidadãos e ao quadro de valores morais em que todos dizem acreditar.