Óscar Afonso, Jornal i
Depois da descolagem em termos de taxa de crescimento no pós adesão à então CEE, em 1986, Portugal entrou num período que genericamente podemos classificar de taxas de crescimento decrescentes. Chegados a um nível de rendimento médio, a trajetória do crescimento económico deixou de ser sustentável.
A abundância de recursos no pós 1986 associada à mão-de-obra barata alimentou uma rápida expansão económica. A economia cresceu pela migração (das áreas rurais para as cidades), pela aglomeração e pela acumulação de capital. Entretanto, as taxas de crescimento começaram a diminuir quando a mão-de-obra se tornou menos abundante, o retorno marginal do capital se tornou menor e as políticas erradas se sucederam.
O país não foi capaz de alterar a sua estratégia de crescimento, saindo de um modelo acumulativo e imitativo e entrando num modelo mais competitivo, mais empresarial e mais inovador. A mudança exigia, da parte dos governos, a liberalização de entraves regulatórios e burocráticos, uma justiça “justa” e célere, um enquadramento institucional seguro e confiável, uma carga fiscal razoável e uma política facilitadora do empreendedorismo. Não tendo sido assim, a maldição foi a abundância; em particular, de burocracia e de intervencionismo público ad-hoc, a favor de protegidos. A “coisa” chegou (e chega) a impressionar pela intensidade e até pela atrocidade. Note-se que a intervenção representa escolha, por quem detem o poder, sobre quem é beneficiado e quem é prejudicado. Tal comportamento foi claramente um convite a lobistas, à fraude, à corrupção, à economia paralela e representou um desvio da função empresarial.
A transição para uma economia mais competitiva e moderna encontrou pois uma resistência inflexível na classe política, com a introdução de ruído na actividade económica, com a promoção de certas actividades privadas, com a exploração do medo da elite em relação à “destruição criativa” de Schumpeter e com a ampliação arcaica da actividade do Estado. À necessidade de promoção de uma economia empreendedora de inovação, extrovertida, Portugal implementou uma política assente em serviços de mão-de-obra barata, introvertida. A trajectória observada na taxa de crescimento (e no défice externo) reflecte, por um lado, a incapacidade do país para competir com países de desenvolvimento semelhante em termos de preços e, por outro lado, a incapacidade do país para competir com países mais desenvolvidos em termos de tecnologia.
Dizem os entendidos (reputados opinion makers da “nossa praça”) que, chegados a este ponto, a solução passa pelo recurso a políticas macroeconómicas de curto prazo, conjunturais e sobre a procura, para inverter a situação. A verdade, no entanto, é que o recurso a essas políticas, para “dar o salto”, não apenas não funciona, como conduz a mais endividamento público, afecta as taxas de juro e gera ainda mais debilidade económica no longo prazo, servindo apenas para acentuar indesejáveis “voos” do produto real efectivo e originando ciclos artificiais de expansão económica seguidos de profundas recessões. Chegados aqui, para colocar Portugal no caminho da prosperidade não basta jogar com a macroeconomia como se fosse uma bola de pingue-pongue. É preciso uma estratégia de desenvolvimento económico de longo prazo, direccionada para o aumento da produtividade. Tal requer, para além da referida e necessária acção do governo, a acumulação de capital físico e humano, e inovação — algo que é impossível sem altas taxas de investimento o que, por sua vez, exige poupança. Ora a baixa taxa de poupança não é um fenómeno recente, mas sim uma característica típica da economia portuguesa.
Em suma, foi-se alimentando a ilusão de que seria possível crescer economicamente num sistema estático e artificial, e que, nomeadamente nas vésperas de eleições, os governos podiam (e podem) promover altas taxas de crescimento, aplicando todo o arsenal de políticas macroeconómicas de curto prazo sobre a procura. Em termos económicos a consequência disso foi a ocorrência de alívios temporários pagos com uma debilidade económica crescente. Em termos políticos, foi-se caindo num sistema que passou a oscilar entre o populismo e o desejo de autoritarismo.