António João Maia, Visão on line,

O Observatório de Economia e Gestão de Fraude (OBEGEF - http://obegef.pt/) está a organizar por estes dias – entre 13 e 15 de Setembro – a Conferência internacional sobre a temática da Percepção Interdisciplinar da Fraude e da Corrupção, a qual se realiza na da Faculdade de Economia da Universidade do Porto.
O evento, que conta com a participação de nomes tão reputados nestas temáticas como sejam, a nível internacional, os de Susan Rose-Ackerman, Robert Klitgaard, Larry Crumbley, Donald McCabe ou Deborah Poff, ou ainda, no plano nacional, os de Rui Rio, Carlos Costa, Carlos Tavares, Maria Cândida Almeida, João Amaral Tomaz ou José Manuel Anes, é provavelmente a reflexão mais abrangente e completa comparativamente a outras realizadas anteriormente em Portugal sobre esta temática. O programa da conferência pode ser consultado em http://www.obegef.pt/i2fc/.
A problemática da fraude e sobretudo da corrupção tem sido tema central no discurso social dos portugueses nos últimos anos. Muito impulsionado pela mediatização de um ou outro caso, o tema tem adquirido um grande destaque ao nível dos principais problemas sociais que têm sido percepcionados e identificados pelos portugueses, como de resto tivemos oportunidade de referir e explicar em textos anteriores (ver por exemplo Corrupção ou corrupções? De que falamos quando falamos de corrupção, em http://visao.sapo.pt/corrupcao-ou-corrupcoes-de-que-falamos-quando-falamos-de-corrupcao=f637361, ou mais recentemente Corrupção política em Portugal: Dez milhões de vítimas, em http://visao.sapo.pt/corrupcao-politica-em-portugal-dez-milhoes-de-vitimas=f665032).
Pela percepção existente e sobretudo porque estamos perante um problema que tem uma existência real, com casos concretos (independentemente da percepção que exista, a fraude a corrupção correspondem a práticas que ocorrem no dia-a-dia das pessoas e das organizações, apesar de, pelas sua características, muitas vezes esses actos não extravasarem o conhecimento daqueles que os praticam e deles retiram dividendos indevidos), importa que a sociedade seja capaz de promover espaços de reflexão e de troca de experiências e saberes – como o que esta conferência se propõe fazer – que envolvam os diversos ângulos de abordagem sobre o problema, quer aqueles que o estudam e tentam compreender numa perspectiva mais académica, quer os que o trabalham no terreno, essencialmente ao nível da prevenção e repressão. Os conhecimentos e experiências que cada um possua são de grande importância e complementaridade para o trabalho dos outros. É bom de ver que só assim, de mãos dadas e com propósitos comuns, parece possível maximizar o conhecimento sobre a questão e potenciar a eficácia das estratégias que possam vir a ser encontradas relativamente ao controlo do problema das práticas de fraude e corrupção nas organizações (públicas e privadas) portuguesas.
Por outro lado, importa salientar também a oportunidade desta conferência, dado ter lugar em pleno período de crise económica e financeira. Como sabemos – e temos tido a oportunidade de experienciar – atravessamos um período de profunda crise que, talvez da forma mais amarga e brusca, nos tem forçado a alterar o estilo de vida e de opções que vínhamos adoptando até há pouco tempo atrás, desde o nível político, passando pelos níveis empresarial e familiar, até ao nível individual.
Se por um lado o contexto da crise representa, em si mesmo, um potencial para um eventual aumento do número de práticas de fraude e corrupção, por outro lado, aparenta ser também um factor com força suficiente para produzir soluções de reconfiguração dos modelos de gestão das organizações (públicas e privadas) no sentido de maximizar procedimentos e investimentos e reduzir custos. É relativamente a qualquer um destes dois efeitos – ambos a meu ver muito prováveis – que importa, nesta particular ocasião, reflectir sobre o problema e lançar eventuais pontes para o desenho de adequadas estratégias de prevenção e controlo sobre o problema.
A fraude e a corrupção são problemas que têm uma existência real em Portugal, tal como têm noutros países e noutras sociedades. Pensar algo diferente e sobretudo pensar em sociedades sem estes problemas é, em meu entender, pura utopia. Mas esta constatação, que transforma o problema numa espécie de inevitabilidade – a fraude a corrupção são, sempre foram e hão-de continuar a ser, problemas inerentes ao desenvolvimento da vivência da organização social dos homens – não nos deve fazer baixar os braços nem desistir. Sendo a perspectiva mais realista, ela não deve porém ser impeditiva de continuarmos a acreditar sempre na possibilidade de encontrar soluções, desenhar estratégias e implementar mecanismos de controlo sobre estas práticas dentro das organizações.
É que da eficácia destas estratégias resultará uma maior solidez na coesão dos cidadãos em torno dos valores sociais e culturais em que acreditam e que devem ser a base de edificação das suas opções e dos seus actos, bem como das expectativas sobre o comportamento dos outros. A eficácia destas estratégias potencia o incremento dos índices de confiança dos cidadãos, uns relativamente aos outros, valor basilar da cooperação social em qualquer relação entre os homens.
Por tudo isto, resta desejar os maiores êxitos à conferência e a todos os que de alguma forma nela participem, nomeadamente que a reflexão que através dela venha a ser produzida seja profícua no sentido de vir a ter uma utilidade efectiva no âmbito de eventuais processos ou projectos estratégicos de controlo do problema entre nós.