Aurora Teixeira, Visão on line,
The problem with political jokes is they get elected. (Henry Cate, VII)
Políticos e fraldas devem ser trocados de tempos em tempos pelo mesmo motivo. (Eça de Queirós)
É o comer que faz a fome. (Eça de Queirós)
Não obstante quase todos os cidadãos defendam que a melhor forma de governo é a democracia, é (cada vez mais) raro encontrar alguém satisfeito com o estado da política e dos políticos na nossa sociedade. Quer sejam queixas sobre a falta de civismo e ética entre os políticos, acordos de bastidores, quer sejam campanhas marcadamente populistas, os apontamentos mais frequentemente efectuados sobre políticos são essencialmente (muito) negativos.
Somos um ‘povo de brandos costumes’, já se sabe ... tolerantes e até mesmo irracionalmente empáticos com os políticos que mentem, torpedeiam, cometem fraudes em prole do ‘povo’, dos ‘desfavorecidos’, quais Robin dos Bosques… Lia eu há dias a propósito das eleições da Madeira um comentário típico: “Este rouba mas é para dar ao povo! Saúde de graça, IVA e taxas inferiores... e excelentes acessos rodoviários. Tomara eu que tivéssemos um político assim no continente!”
É assim um lugar (tristemente) comum a ideia que os políticos mentem, cometem fraudes. Em qualquer dos casos, aparentemente “ninguém vai preso” (Carlos Anjos, inspector da PJ, em entrevista. "Correio da Manhã", 10/01/2010) nem é mesmo responsabilizado!
Não obstante serem usados frequentemente como sinónimos, ‘mentir’ e ‘cometer fraude’ são dois conceitos distintos.
Mentir, ou efectuar uma afirmação que é falsa, muito raramente é considerado crime. Mentir é tão ubíquo que a lei não pode fazer muito mas impedir este comportamento tão comum. Se nos lembrarmos dos debates políticos televisivos (mas não só) percebemos perfeitamente que qualquer um dos candidatos não pode estar a dizer a verdade sobre tudo. Por vezes as ‘histórias/argumentos/casos’ são tão diferentes que nos perguntamos se os interlocutores habitam no mesmo país ou mesmo no mesmo planeta!
Relativamente à fraude a enfâse do crime está na implicação da afirmação/acto e não na sua veracidade. Muitas afirmações fraudulentas são ‘verdades’ no sentido ‘técnico’ mas são concebidas para fornecer uma impressão falsa sobre a situação real. Adicionalmente, ocorrem em geral quanto o seu emissor possui pleno controle da situação e linguagem a ser utilizada. Uma afirmação falsa tem directamente uma implicação falsa mas também a pode ter uma ‘metade-verdade’, uma verdade ‘técnica’ ou mesmo uma verdade ‘literal’.
Segundo o advogado David G. Mills, (“Lying/Perjury vs. Fraud/Deceit”, Dissident Voice, 02/08/2003) o crime de fraude envolve 3 elementos: 1) uma afirmação da parte do emissor que tem uma implicação falsa; 2) o acreditar por parte do receptor no que julga ser verdade e efectuar acções baseadas nessa mesma suposição; 3) o receptor causar danos para ele e para outros quando realiza as acções que se esperam dele(a).
Apliquemos, a título de ilustração, o enquadramento de Mills ao caso do Alberto João Jardim (AJJ) - é só o exemplo mais recente; infelizmente, estes case studies abundam na política portuguesa. Não sendo advogada, nem aspirando a o ser, posso inferir que as acções/afirmações de AJJ não são triviais. Pode-se mesmo dizer que constituem o modus operandi de AJJ efectuar afirmações que são, no melhor dos casos, meias verdades/verdades técnicas e, nos piores, falsidades, proferidas para alienar parte do seu eleitorado.
Falsidade: “Não existiu qualquer ocultação da dívida da Madeira” ... “houve um acerto com a banca e fornecedores” ... “está tudo transparente”.
Meia-verdade: “O problema está nos cubanos do continente”.
Verdade ‘técnica’: “Enquanto eu estiver na política activa na Madeira, seja qual for o partido que esteja no poder em Lisboa, ninguém toca nos direitos do povo madeirense, porque o meu partido é a Madeira”.
Seria assim esperado que o eleitorado (ou pelo menos parte) Madeirense se baseasse no que aparentemente pareceria ser verdade. Ao elegerem, por maioria absoluta, por mais um mandato, AJJ os Madeirenses irão certamente causar danos a eles próprios e aos outros (“os cubanos do continente”).
Em síntese, estamos perante um crime de fraude!