Mariana Costa, Visão on line,
A Lei n.º 53-E/2006, de 29 de Dezembro veio aprovar o novo regime geral das taxas das autarquias locais (RGTAL). O seu principal objectivo foi criar finalmente mecanismos de controlo às taxas praticadas pelas autarquias locais, controlo esse que era praticamente inexistente.
A taxa caracteriza-se por ser uma prestação coactiva devida a um ente público, distinguindo-se dos impostos por ser dotada de natureza comutativa, isto é, por constituir uma contraprestação devida por um serviço ou utilidade que a entidade pública prestou àquele que tem de a pagar. Nos termos do artigo 3.º do RGTAL, a cobrança de uma taxa pela autarquia local pode ter na sua origem uma de três situações: i) a prestação de um serviço pela autarquia; ii) a utilização privada de bens do domínio público e privado da autarquia ou iii) a remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares, quando tal seja atribuição da autarquia, nos termos da lei.
Por força do princípio da equivalência jurídica (também designado princípio do ganho privado), previsto no artigo 4.º do RGTAL, o valor das taxas tem de ser fixado em função do custo da actividade para o ente público ou do benefício auferido por aquele que dela aproveita.
De entre as inovações trazidas pela Lei n.º 53-E/2006, aquela que mais se destaca diz respeito às novas exigências legais para criação das taxas das autarquias, estatuídas no artigo 8.º. Assim, o regulamento de criação das taxas das autarquias locais tem de conter, sob pena de nulidade: “a) A indicação da base de incidência objectiva e subjectiva; b) O valor ou a fórmula de cálculo do valor das taxas a cobrar; c) A fundamentação económico-financeira relativa ao valor das taxas, designadamente os custos directos e indirectos, os encargos financeiros, amortizações e futuros investimentos realizados ou a realizar pela autarquia local; d) As isenções e a sua fundamentação; e) O modo de pagamento e outras formas de extinção da prestação tributária admitidas; f) A admissibilidade do pagamento em prestações.” Estes regulamentos têm ainda de fixar as regras relativas à liquidação e cobrança das taxas (artigo 10.º do RGTAL).
É de louvar a iniciativa legislativa em causa e as preocupações de transparência nela ínsitas. Senão analisem-se algumas das tabelas de taxas anteriores à Lei n.º 53-E/2006 e verifique-se a hipertrofia de taxas e de isenções, a confusão entre taxas e preços de direito privado e sobretudo a falta de conformidade entre o custo da actividade pública local e/ou o benefício auferido pelo particular e o valor concreto da taxa.
Sucede porém que as boas leis de pouco ou nada servem sem uma correcta aplicação e sindicância. A acentuada diversidade de dimensão das autarquias locais em Portugal, associada à escassez de meios técnicos e humanos qualificados, a deficientes dados contabilísticos e à actual crise financeira vieram adiar sucessivamente a obrigatoriedade dos regulamentos de taxas vigentes obedecerem às exigências do artigo 8.º, o que veio a acontecer em 30 de Abril de 2010 (Lei n.º 117/2009, de 29 de Dezembro).
Ora, decorridos quase 10 meses sobre esta data impõe-se uma avaliação. Conseguiu o RGTAL efectivamente purgar as anteriores tabelas de taxas da multiplicação de tributos associados a uma mesma actividade da autarquia ou dos preços de direito privado? Ou ainda, qual a relação que existe entre os estudos de fundamentação económico-financeira e os valores efectivos das taxas que estão a ser cobrados? E qual o rigor/credibilidade dos dados constantes desses mesmos estudos de fundamentação económico-financeira? E qual o peso que a possibilidade de introduzir um coeficiente de desincentivo à prática de certos actos ou operações (artigo 4.º, n.º 2 RGTAL) está efectivamente a ter?
A resposta concertada a nível nacional às questões colocadas acima permitir-nos-á avaliar do impacto efectivo do RGTAL no aumento da transparência na cobrança de taxas pelas autarquias locais. Até lá, sugerimos a análise do estudo efectuado por Manuela Costa e Sara Serra, do Instituto Politécnico do Cávado e do Ave, com respeito aos novos regulamentos de taxas das autarquias locais de Guimarães, Esposende, Ponte da Barca e Vizela (A aplicação da Lei n.º 53-E/2006 nas autarquias locais: principais conclusões, disponível